Você já se sentiu culpado por “querer chamar atenção”? Se sim, você não está sozinho. Vivemos em uma cultura que transformou uma das nossas necessidades mais básicas em algo vergonhoso, quase patológico. Dizemos que alguém é “carente” quando expressa necessidade de reconhecimento, como se isso fosse um defeito de caráter, não uma condição humana universal.
Mas e se eu te dissesse que essa visão está completamente equivocada? E se a busca por atenção for, na verdade, uma das manifestações mais sofisticadas da nossa humanidade?
O psicanalista britânico Adam Phillips, em seu provocativo livro Attention-Seeking (Buscando atenção), faz uma afirmação inquietante: “Attention-seeking é uma das melhores coisas que fazemos, mesmo quando temos as piores maneiras de fazê-lo.”
Esta frase desafia décadas de estigma social e nos convida a repensar completamente nossa relação com a necessidade de ser vistos, ouvidos e reconhecidos. Phillips não está defendendo comportamentos manipulativos ou narcisistas. Ele está fazendo algo muito mais radical: está nos lembrando de que buscar atenção é uma forma fundamental de sociabilidade.
O Bebê como Nosso Primeiro Professor
Para entender por que buscar atenção é natural, Phillips nos convida a observar bebês. Eles são, nas suas palavras, verdadeiros especialistas em chamar atenção. E não é manipulação – é sobrevivência emocional e física.
Um bebê que chora não está sendo “dramático”. Está comunicando uma necessidade real através do único meio disponível. Está testando se o mundo responderá às suas demandas, se existe alguém disposto a prestar atenção ao que ele precisa.
Quando crescemos, essa necessidade não desaparece – apenas se sofistica. Adultos continuam precisando saber se suas necessidades emocionais serão reconhecidas e atendidas. A diferença é que desenvolvemos formas mais elaboradas (e às vezes disfuncionais) de buscar essa atenção.
A Atenção como Forma de Amor
Na psicanálise, sabemos que a atenção é uma das primeiras formas de amor que experimentamos. O olhar atento da mãe não apenas acalma o bebê – literalmente o constitui como sujeito. Somos, em grande medida, aquilo para o que os outros prestam atenção em nós.
Phillips escreve: “Tudo depende do que, se é que algo, consideramos interessante – do que somos encorajados e educados a achar interessante, e do que nos vemos sendo interessados apesar de nós mesmos.”
Esta frase revela algo fundamental: nossa identidade se forma através da atenção que recebemos e da atenção que aprendemos a dar. Quando uma criança é constantemente ignorada ou quando sua curiosidade natural é desencorajada, ela aprende que certas partes de si não merecem atenção. Isso cria feridas profundas que podem durar décadas.
A Arte de Reconhecer Suas Necessidades
Phillips nos ensina que attention-seeking bem compreendido é uma forma de autoconhecimento. Quando prestamos atenção ao tipo de atenção que buscamos, descobrimos muito sobre nós mesmos:
- Que tipo de reconhecimento você valoriza mais? Intelectual? Emocional? Criativo?
- De quem você mais precisa de atenção? E por quê especificamente dessas pessoas?
- Como você se sente quando é verdadeiramente visto e compreendido?
- Que partes de você ainda se sentem invisíveis?
Transformando Vergonha em Compreensão
O primeiro passo para uma relação mais saudável com nossa necessidade de atenção é parar de patologizá-la. Em vez de pensar “eu não deveria precisar disso”, experimente pensar “o que esta necessidade está tentando me comunicar?”
Algumas reflexões práticas:
- Mapeie sua história de atenção: Que tipo de atenção você recebia na infância? Como isso moldou suas expectativas atuais?
- Identifique suas formas genuínas de buscar atenção: Quando você busca atenção de forma autêntica versus quando faz isso de forma ansiosa ou manipulativa?
- Pratique pedir atenção diretamente: “Preciso que você me ouça por alguns minutos” é muito mais eficaz do que comportamentos indiretos.
- Cultive sua curiosidade não-oficial: Reserve tempo para explorar o que genuinamente desperta seu interesse, mesmo que pareça “irrelevante” para outros.
A Atenção Mútua como Base da Intimidade
Uma das descobertas mais bonitas de Phillips é que attention-seeking genuíno é sempre uma busca por intimidade. Quando buscamos atenção de forma autêntica, estamos dizendo: “Existe algo em mim que vale a pena conhecer. Você gostaria de descobrir o que é?”
Esta é uma vulnerabilidade corajosa, não uma fraqueza. Requer coragem mostrar partes de nós que podem ser rejeitadas ou mal compreendidas.
Próximos Passos na Jornada
Esta reflexão sobre a naturalidade da busca por atenção é apenas o começo de uma jornada mais ampla de autoconhecimento. Na próxima semana, exploraremos como a vergonha – essa emoção tão presente em nossa relação com a atenção – pode estar controlando nossa vida de formas que nem percebemos.
Pergunta para reflexão desta semana: “Se você pudesse pedir exatamente o tipo de atenção que precisa, sem medo de julgamento, o que pediria? E a quem?”
Uma Nota Importante
Como psicanalista, é fundamental esclarecer que este conteúdo tem fins educativos e reflexivos, não substituindo acompanhamento psicológico profissional. Se você percebe que sua relação com a busca por atenção está causando sofrimento significativo ou interferindo em suas relações, encorajo que procure ajuda especializada.
A análise oferece um espaço único para explorar essas questões com a profundidade e o cuidado que merecem – sem julgamentos, apenas com genuína curiosidade sobre quem você é e o que precisa para florescer.
Referências:
- Phillips, A. (2019). Attention-Seeking. Penguin Books.
- Freud, S. (1914). Sobre o Narcisismo: Uma Introdução.
- Winnicott, D. W. (1965). O Ambiente e os Processos de Maturação
